segunda-feira, 4 de maio de 2015

Biomarcadores e Doença Cardíaca. O papel dos Peptídeos Natriuréticos.


Artigo da autoria de:
Inês Bettencourt, Luis Lima Lobo
Hospital Veterinário do Porto, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias


Na última década tem surgido um grande interesse na investigação dos biomarcadores cardíacos em Medicina Veterinária. Os biomarcadores são hormonas elaboradas por um tecido específico do organismo que podem ser detetadas na circulação sanguínea. Alguns exemplos de biomarcadores usados frequentemente na prática clínica diária são o BUN e a creatinina para a função renal e a ALT e os ácidos biliares como marcadores de lesão e função hepática.

As aplicações clinicas dos biomarcadores cardíacos passam pela deteção de doenças subclínicas, determinação do prognóstico e severidade da insuficiência cardíaca, podendo ser úteis na determinação de uma terapia médica individualizada, assim como na avaliação da progressão da doença e da resposta ao tratamento.

Os péptidos natriuréticos (PN) são exemplos de biomarcadores, específicos de stress cardíaco, mais especificamente dos miócitos e têm um papel importante na regulação da homeostase cardiovascular.

Os péptidos natriuréticos mais estudados são o ANP (Péptido Natriurético Atrial), BNP (Péptido Natriurético Tipo B), Péptido Natriurético Tipo C e o DNP (Dendroaspis Natriuretic Peptide).

O BNP, originalmente identificado no cérebro de suínos e daí chamado de PN cerebral, é encontrado também no tecido miocárdico, mais especificamente nos ventrículos. No entanto, num estudo de Oyama et al, constatou-se que o BNP também se encontra elevado em situações de distensão atrial em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva (ICC).

Os Tipo B são os mais estudados, tal como a sua pró-hormona amino-terminal NT-proBNP, sendo estes os biomarcadores cardiovasculares mais importantes, estando agora bastante difundidos em Medicina Veterinária. Têm demonstrado ser de grande utilidade na confirmação do diagnóstico de insuficiência cardíaca, auxiliando na estratificação de perfis de risco a longo prazo. Oyama et al (2007), refere num estudo realizado a partir de medições das concentrações de diversos PN para a determinação de cardiomiopatia oculta, que há uma elevação das concentrações de BNP e ANP em cães assintomáticos que apresentam evidência electrocardiográfica e ecocardiográfica de cardiomiopatia. Revela-se assim a vantagem da análise destes que permitem uma ação terapêutica precoce e indicada para a patologia do animal.

Os BNP demonstraram serem anti-fibróticos, hipotensivos, natriuréticos, diuréticos e possuírem uma função relaxante no músculo liso, proporcionando um mecanismo protetor a nível cardiovascular.

A estimulação do músculo cardíaco pelo estiramento do miocárdio ou por hipoxia, leva a uma rápida produção de BNP, associada a uma sobrecarga de volume em pacientes com disfunção cardíaca.

Em humanos, os BNP e NT-proBNP são considerados biomarcadores cardiovasculares na ICC, sendo o NT-proBNP um dos marcadores mais recentemente associado a disfunção ventricular. São um excelente fator de diagnóstico em humanos que apresentem insuficiência cardíaca aguda e dispneia, apesar dos valores do NT-proBNP serem influenciados tanto pela idade como pela função renal.

Quando se interpretam os valores dos PN em cada animal há que ter em consideração outros fatores que podem igualmente influenciar estes valores, tais como a idade e o sexo do animal, função renal, função da tiroide e a presença de anemia. Num estudo realizado por DeFrancesco et al, não se conseguiu demonstrar uma relação estatisticamente significativa dos valores de BNP com a idade ou o sexo, apesar das concentrações de BNP estarem elevadas em cães machos e mais velhos. A obesidade é um fator que pode induzir uma diminuição dos valores sanguíneos do BNP e NT-proBNP.

Foram efetuados vários estudos em animais dispneicos com o objetivo de diferenciar, através dos biomarcadores cardíacos, a origem cardíaca ou não da dispneia. Oyama et al (2007), tinha como objectivo medir os níveis plasmáticos de ANP, BNP, endotelina e troponinas cardíacas I para distinguir se a dispneia em 48 cães tinha uma causa cardíaca ou não, chegando à conclusão que os PN como o NT-proANP, o BNP e a endotelina se encontravam mais elevados em pacientes com ICC. A partir de 330 cães, DeFrancesco et al (2007), verificou que os animais com tosse ou dispneia apresentavam níveis de BNP elevados quando a causa dos sintomas era cardíaca.

Por outro lado, Baumwart et al (2005), demonstrou que as concentrações de BNP em Boxers com cardiomiopatia arritmogénica ventricular direita não se encontram elevadas em comparação com animais saudáveis.

Em raças como o Dobermann, a cardiomiopatia dilatada (CMD) tem um componente genético, sendo uma doença de progressão lenta e uma das causas mais importantes de morbilidade e mortalidade em cães de raças grandes e gigantes. Por questões de prognóstico, terapêutica ou reprodução o diagnóstico precoce de CMD é essencial. Wess et al (2011) demonstrou que as concentrações de NT-proBNP se encontravam aumentadas em cães com CMD, mas também naqueles que vieram a desenvolver a doença num período de ano e meio.

A pesquisa de BNP e NT-proBNP pode também ser aplicada em gatos, para diferenciar insuficiência cardíaca de doença respiratória em animais com sinais respiratórios, tendo uma precisão de cerca de 90%. De acordo com Oyama et al (2012) os valores de BNP estão aumentados em gatos com doença cardíaca.

Uma da vantagens da utilização do BNP como auxiliar de diagnóstico de ICC é o facto de ser apenas necessária uma pequena quantidade de sangue, sendo acessível a qualquer clinico e não envolvendo meios técnicos dispendiosos ou que requerem técnicas muito especializadas. Se a sua interpretação for utilizada em conjunto com outros meios de diagnóstico convencionais, especialmente a radiografia, mas também a electrocardiografia e a ecocardiografia, consegue-se obter uma maior precisão e rapidez de diagnóstico. A realização de exames sanguíneos no diagnóstico de doença cardíaca em fase oculta é também uma das áreas promissoras na pesquisa de biomarcadores em amostras de sangue.


Referências

Boswood A. Biomarkers in cardiovascular disease: beyond natriuretic peptides. Journal of Veterinary Cardiology (2009) 11, S23-S32.

Baumwart RD, Meurs KM. Assessment of plasma brain natriuretic peptide concentration in boxers with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. AJVR, Vol 66, No 12, December 2005. 
DeFrancesco TC, Rush JE et al. Prospective clinical evaluation of an ELISA b-type natriuretic peptide assay in the diagnosis of congestive heart failure in dogs presenting with cough or dyspnea. J Vet Intern Med 2007;21:243-250.
Kimmenade RRJ, Januzzi JL. The evolution of the natriuretic peptides – current applications in human and animal medicine. Journal of Veterinary Cardiology (2009) 11, S9-S21. 
Oyama MA, Sisson DD et al. Distinguishing cardiac and noncardiac dyspnea in 48 dogs using plams atrial natriuretic factor, b-type natriuretic factor, endothelin, and cardiac troponin-I. J Vet Intern Med 2007;21:238-242.
Oyama MA, Sisson DD et al. Prospective screening for occult cardiomyopathy in dogs by measurement of plasma atrial natriuretic peptide, b-type natriuretic peptide, and cardiac troponin-I concentrations. AJVR, Vol 68, No 1, January 2007.
Wess G, Butz V et al. Evaluation of n-terminal pro-b-type natriuretic peptide as a diagnostic marker of various stages of cardiomyophathy in doberman pinschers. AJVR, Vol 72, No 5, May 2011.

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